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 Estudos Budistas

Tradição do Ven. Thich Nhat Hanh

 

Sair da prisão do passado e do futuro

 

Na nossa vida diária, muito frequentemente a nossa mente não está com o nosso corpo. A nossa mente pode estar presa no passado. Nos afogamos no nosso arrependimento, na nossa tristeza, por causa do passado. O passado torna-se uma prisão para nós. Não conseguimos sair.

 

Muitos de nós não somos livres do passado. Estamos presos pelo nosso arrependimento e tristeza. Não conseguimos viver a nossa vida porque estamos numa prisão. Então, inspirar conscientemente pode ajudar-nos a sair do passado, para que possamos ser livres para estar com o nosso corpo, porque quando mente e corpo estão juntos, podemos estabelecer-nos no momento presente.

 

Se mente e corpo não estão juntos, não estamos no momento presente, no aqui e agora, e a vida, a vida real, só está disponível no momento presente, porque o passado já não existe, e o futuro ainda não chegou. A vida, e todas as suas maravilhas, só podem ser encontradas no momento presente.

 

Assim, uma única inspiração consciente pode ser suficiente para nos libertar da prisão do passado, trazer a nossa mente de volta ao nosso corpo, para que possamos regressar a casa, ao aqui e agora, onde a vida está disponível, e podemos tocar o céu azul, tocar a chuva, tocar a nuvem, tocar as árvores, tocar as canções dos pássaros, e a primeira coisa que tocamos é o nosso próprio corpo.

 

O terceiro exercício de respiração consciente, proposto pelo Buda, é: ao inspirar, estou consciente do meu corpo, da existência do meu corpo. É tão simples, e não é preciso esforço, nem luta, para fazer isso, e pode até ser muito agradável, porque inspirar pode ser muito agradável, quando não temos asma, quando o nosso nariz não está congestionado, e então respirar o ar fresco pode ser muito agradável. Ao inspirar, desfruto da inspiração. Ao inspirar, estou consciente de que tenho um corpo. Por isso, não é um trabalho árduo.

 

Muitos de nós, se não estivermos presos na prisão do passado, então estamos presos na prisão do futuro. Muitos de nós nos preocupamos com o futuro, e não sabemos o que irá acontecer no nosso futuro, então passamos o tempo a nos preocupar com o futuro, e há medo do futuro.

 

Há ansiedade, incerteza, sobre o futuro. Este tipo de energia negativa não é nutritiva nem curativa, e a maioria de nós sacrifica o momento presente em prol do futuro. Muitos de nós somos bons em nos preparar para o futuro, mas não somos bons em viver o momento presente. Podemos nos preparar para o futuro, mas não somos capazes de desfrutar do momento presente, e ficamos presos no medo, na incerteza, sobre o futuro, e o futuro torna-se uma prisão.

 

Não estamos realmente vivendo a nossa vida porque não temos liberdade, e sabemos que a liberdade é a base da verdadeira felicidade. Não a liberdade política, mas a liberdade em relação ao passado, em relação ao futuro. Porque com a tristeza, o arrependimento, os complexos, o medo, a ansiedade, somos escravos, estamos presos por estas energias, não somos livres, e é por isso que a alegria e a felicidade não são possíveis. Uma vida feliz não é possível.

 

Assim, sentar-se é uma forma de ser livre, e pode ser útil cuidar do seu corpo, da sua respiração, da sua mente, de tal maneira que possa restaurar a liberdade, porque uma única inspiração feita com atenção pode libertá-lo da prisão do passado e do futuro.

 

Basta tomar consciência de que você tem um corpo, e sorrir para o seu corpo, para o ajudar a estar plenamente presente no aqui e agora, para que possa viver a sua vida profundamente. Então o seu corpo — quando você está em contacto com o seu corpo — pode lhe proporcionar um insight, a atenção plena e a concentração dirigidas ao seu corpo. O seu corpo torna-se o objeto da sua atenção plena, porque a atenção plena é sempre atenção plena de algo.

 

Quando você respira, isso é atenção plena na respiração. Quando você bebe, atenção plena ao ato de beber. Quando você caminha, atenção plena ao caminhar. Quando você está zangado, e sabe que está zangado, isso é atenção plena da raiva. A atenção plena é sempre atenção plena de algo. Isto é atenção plena do corpo: ao inspirar, antes de mais nada, o objeto da atenção plena é a sua inspiração, e a sua inspiração lhe traz de volta ao seu corpo e torna-se atenção plena do corpo.

 

Se você está verdadeiramente consciente do seu corpo, está também concentrado, porque a atenção plena e a concentração andam juntas. Quando você está consciente de algo, e está muito consciente desse algo, está, de certa forma, concentrado nisso. Estar concentrado significa que você presta atenção apenas naquilo, e não em outras coisas. Liberta-se de todo o resto, mantendo apenas um único objeto, e esse objeto pode ser a sua inspiração, pode ser o chá que você está bebendo, ou pode ser o seu corpo, a atenção plena do corpo.

 

O Buda nos deu um sutra inteiro sobre a prática da atenção plena do corpo — a contemplação do corpo — e quando você está consciente do seu corpo e verdadeiramente concentrado no seu corpo, pode facilmente e rapidamente perceber que o seu corpo é uma maravilha, um mistério. Acredito que os biólogos, muitos deles, são capazes de ver que o nosso corpo é uma maravilha. Está muito bem organizado. A biologia tenta compreender o corpo, mas a nossa compreensão do corpo ainda não é suficiente, ainda não é completa. É uma maravilha, e você possui uma maravilha. O seu corpo é uma maravilha.

 

(Palestra de Darma de Thich Nhat Hanh: em 7 de outubro de 2012– transcrito do vídeo do YouTube

https://youtu.be/4p-AuV-koWQ)

Traduzido por Leonardo Dobbin)

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